A medicina pós-pandemia

Por Dr. Odair M. Branco 31/07/2020 - 11:22 hs

Há uma forte teoria que já separa o mundo antes e pós-Covid-19. A área médica, por exemplo, não será mais a mesma. E os efeitos já são percebidos no dia a dia, pois ao mesmo tempo em que o mundo espera por mais interação tecnológica, também clama por mais profissionais da saúde. Tecnologia e pessoas juntas!

Momento que ainda evidenciou e desmistificou outras práticas, como a telemedicina, e resgatou hábitos simples de higiene, como lavar as mãos, base para a prevenção. Neste cenário, também é certo que a demanda por médicos será ainda maior nos próximos anos.

É difícil calcular de forma precisa os danos que o novo Coronavírus (Covid-19) tem causado em esfera global. São mortes, a ruptura no sistema de saúde de muitos países atingidos e a crise econômica que já alcança as mais diversas camadas sociais. 

A pandemia impôs uma série de medidas de proteção que impactam diretamente no cotidiano das populações, exigindo, sobretudo, o distanciamento social, e com ele, uma inventiva e desafiadora nova rotina, na qual é necessário encarar os medos e estar aberto a compreender as transformações.  

Tudo isso vai gerar muita insegurança e mais ansiedade por parte das pessoas. E a ansiedade é um gatilho para fazer nascer grandes questões, grandes adoecimentos como as depressões e as síndromes do pânico. Renunciamos às causas ideológicas, então, tudo o que nos resta é uma administração eficaz da vida, isso é a biopolítica, uma pós-política que deixa para trás nossos velhos combates ideológicos para se centrar na gestão e administração especializadas na vida. E, ao mesmo tempo, existe também uma sincronia, não temos uma medicação, não temos uma vacina, então, estamos todos submetidos a mesma experiência, ao medo de ser contagiado. 

O que eu gostaria que acontecesse mesmo na pós-pandemia: um mundo mais solidário, em que os laços fossem feitos de formas mais sólidas e fortificadas, eu gostaria que a palavra do nosso velho Sigmund Freud valesse quando ele diz que nós ‘somos constituídos como sujeito a partir de um olhar do outro’, que nós precisamos desse outro para nos constituir, formar nossa subjetividade. Eu gostaria que no mundo pós-pandemia, isso fosse valorizado, de que não podemos viver isolados, não podemos viver sem o outro. Precisamos da presença do outro, precisamos do corpo do outro, que o medo não nos distancie ainda mais desse outro, que ele não seja uma ameaça, mas sim uma ponte para construção de projetos, de uma sociedade mais justa e solidária. 

Há expectativas para mudanças na nossa relação com o consumo, também é esperado que a tecnologia faça mais parte do trabalho – como as reuniões via vídeo-transmissão.

Nós não poderíamos ter um sistema universal de saúde para 200 milhões de pessoas, o maior do mundo, sem uma base produtiva e tecnológica que envolva a indústria farmacêutica, equipamentos, serviço de saúde.

A necessidade de o SUS ser potente e qualificado. A pandemia tem mostrado que cortar recursos da saúde pública para investir na rede privada não é a solução, observa a especialista.

Acho que tem de ser fortalecida essa ideia de saúde primária, essa que acontece no cotidiano, na estratégia de Saúde da Família/Comunitária, porque é ali que a maioria das pessoas tem um acesso mais facilitado

Nesse sentido, fica a lição também para a integração entre os níveis municipais, estaduais e federal. Uma emergência de saúde requer coordenação nacional que seja capaz de se adaptar às realidades locais.

Outra lição é a importância do investimento em pesquisa científica para além da fisiologia. Saúde é um tema que diz respeito também à economia, à sociedade, à moral e à história.

De um lado, você não tem renda, ou seja, você não circula as mercadorias que essa sociedade produz – as pessoas não trabalham, logo, não tem dinheiro, logo, não consomem. Por outro lado, chegaria um tempo em que não haveria mais mercadorias, ou em pouca quantidade, porque as pessoas que as produzem estão doentes e não podem produzi-las. Logo, você teria uma quebra das empresas.

Essa perspectiva mostra a importância da tomada de consciência sobre saúde ser um investimento, não um gasto, como é o pensamento coletivo.